sábado, 2 de maio de 2009

CITANDO MÁRIO CRESPO

Opinião - Jornal de Notícias - Mário Crespo

Desculpem, não tenho soluções!

Ouvir dizer ao mais alto nível do Estado que não há soluções para ohorror do desemprego é ouvir dizer que o Estado faliu. Meia centena detrabalhadores despedidos de fábricas em Barcelos e Esposende tiveramessa experiência de anticidadania. Numa visita, o presidente daRepública foi confrontado com um grupo de desempregados que empunhavamcartazes pedindo ajuda. Foi ter com eles e disse-lhes que não tinhanenhuma solução para os seus problemas.Para um chefe de Estado é proibido dizer isso aos seus concidadãos edepois embarcar num carro alemão de alto luxo e cilindrada, acenando,apoquentado, aos que nada têm.É isso que faz querer que os ricos paguem as crises.Só se é chefe de um Estado para trabalhar na busca de soluções eencontrá-las. Sem isso não se é nada. Ser presidente em Portugal não éum cargo ritual. O presidente tem nas mãos ferramentas poderosas parainfluenciar o destino do país. Pode nomear e demitir governos, chamaragentes executivos e executores, falar aos deputados sempre quequiser, reunir conselheiros, motivar empresários, admoestar ministrose deve, sobretudo, exigir resultados. Ser chefe de Estado em Portugalinclui poderes executivos, e como tal, ter responsabilidades deexecutivo. Ao dizer que não tem soluções para as vítimas do descalabroque há três décadas estava em gestação no país onde ocupou os maiselevados cargos, o presidente da República dá à Nação a mensagem deque nem ao mais alto nível há o sentido da responsabilidade nem acultura de responsabilização.Ao dizer aos desempregados de Barcelos que nada pode fazer, opresidente diz a todo o Portugal que o Estado e o seu sistema não sãomais do que um imenso círculo de actores autodesresponsabilizados quevão passando a batata-quente de uns para os outros. Depois destasdeclarações aos desempregados, o célebre letreiro "The Buck StopsHere", que Roosevelt tinha na sua secretária, não tem lugar na mesa detrabalho do presidente português. Com esse letreiro, que equivale adizer que a batata-quente não passa daqui, Roosevelt lançou as basesda maior economia do Mundo das cinzas da grande depressão. EmPortugal, na maior depressão de sempre, o presidente diz que não temsoluções. Devia tê-las. Aníbal Cavaco Silva desde Sá Carneiro queparticipa no Governo. Dirigiu executivos durante a década em quePortugal teve a oportunidade histórica de ter todo o dinheiro do Mundopara se transformar num país viável. Mesmo com a viabilidade daeconomia questionada, Cavaco Silva, como profissional que é, regressaà política com uma longa e feroz luta pela presidência da República.Assumiu-se como a "boa moeda" que conseguiria resistir às investidasdas "más moedas", na sua cruel pedagogia da Lei de Gresham, que foideterminante para aniquilar um governo do seu próprio partido edar-lhe a chefia do Estado.É um homem de acção impiedosa e firme, quando a quer ter.Se o pronunciamento que fez de não ter soluções para esta crise foiuma tentativa de culpabilizar só o Governo, então foi de uminsuportável, mas característico, tacticismo. Se foi sincero, entãofoi vergado pelo remorso, e anunciou que a sua longa carreira depolítico e de homem público chegou ao fim.

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