PENSAMENTOS ABERTOS E LIVRES - 86

Aconselho vivamente a leitura deste artigo. Principalmente aos que, sem conhecerem a História da "coisa" acreditam nas mil mentiras repetidas para suportar uma só narrativa... As mentirinhas de que vai vivendo a grande mentira Vivemos num ambiente tóxico, feito de mil mentiras repetidas para suportar uma só narrativa: Israel tem de morrer. A mesma narrativa que no 7 de Outubro levou à alegria do grito “mãe, matei um judeu!” José Manuel Fernandes, 06Out25, in Observador Não devia surpreender ninguém o acidente quase fatal daquele jovem que decidiu subir a um comboio na Estação do Rossio, em Lisboa, e ia morrendo electrocutado. E não devia surpreender porque a invasão daquele interface ferroviário e a tentativa de perturbar a circulação dos comboios, apesar de não expressamente convocada, insere-se com a maior das naturalidades na lógica das manifestações radicais ditas pró-palestinianas que têm saído às ruas de toda a Europa. Primeiro, porque da retórica agressiva, violenta mesmo, dos manifestantes até acções destinadas a assumidamente perturbar a vida dos cidadãos comuns e a ordem pública vai apenas um pequeno passo. Depois, porque os órgãos de informação que esfarrapam as vestes contra aquilo que designam como “discurso de ódio da extrema-direita”, acolhem depois com benevolência, quando não mesmo com aplauso, a violência sem disfarces dos radicais de esquerda. Uma coisa vai a par com a outra e algo dá cor e corpo à orquestra: a repetição sistemática, ad nauseum, de todo o tipo de pequenas e menos pequenas mentiras, que depois desaguam na grande mentira que é a de apresentar como “rosto do humanismo” os radicais intolerantes e agressivos que enrolam à volta do pescoço um keffieh e logo acham que assim tudo lhes é permitido. Mesmo quase morrer electrocutado. Para ser franco, o grau de delírio a que já se chegou torna difícil qualquer debate, mesmo o simples acto de dizer que é preciso conhecer melhor a realidade – e a História – do Médio Oriente antes de começar a tomar como verdades irrefutáveis, e base de todas as indignações, aquilo que não passa de uma multitude de enganos, mistificações, muitas vezes falsidades assumidas. Mesmo assim, e porque sou teimoso, sinto-me obrigado a tentar separar o trigo do joio, peneirando algumas daquelas frases que vamos ouvindo todos os dias e que, como já está a acontecer, partem de um grão de verdade para depois acabar numa qualquer forma de preconceito não apenas anti-Israel, mas cada vez mais antissemita. Vamos lá então, falso axioma por falso axioma: “Há um consenso geral sobre a solução dos dois Estados, só a extrema direita de Netanyahu é que não aceita”. A parte de verdade é que há ministros de extrema-direita no governo de Netanyahu que sempre recusaram — e recusarão — a criação de um estado palestiniano, mas não só a posição do primeiro-ministro não é essa, como na verdade ele já teve várias posições ao longo da sua vida política, primeiro opondo-se a essa ideia, depois aceitando-a (em 2009), por fim recuando para uma posição equívoca após o 7 de Outubro, posição que abandonou ao aceitar o plano de paz proposto por Trump que, mesmo não incluindo um plano detalhado para a criação de um Estado palestiniano, acaba por ter implícito que esse será o resultado final do processo que agora se quer iniciar. Mas, mais importante do que as posições conjunturais de Netanyahu, o que deveria contar é a posição histórica de Israel, que aceitou em 1947 a partição da Palestina em dois estados, solução na altura recusada pelos árabes, que tentaram afogar em sangue o novo Estado judaico e perderam. Depois disso, a aceitação de dois Estados foi a base dos acordos de Oslo de 1992, era a base do acordo de Camp David recusado por Arafat e era de novo a base da proposta israelita de 2008, proposta mais uma vez recusada pelos palestinianos. Em contrapartida, só depois de 1978 e do acordo entre o Egipto e Israel é que começou a haver Estados árabes que reconheceram Israel, um processo ainda longe de chegar ao fim. Do lado palestiniano ou há radicais, como o Hamas, que não aceitam qualquer Estado judeu, ou há hipocrisia, pois em todas as negociações das últimas décadas a Autoridade Palestiniana lutou sempre para que a formulação fosse a de “dois Estados lado a lado convivendo pacificamente” e nunca a de “um Estado judeu e um Estado árabe lado a lado convivendo pacificamente”. Parece um detalhe, mas não é: faz mesmo toda a diferença. Por fim, aqueles que desfilam pelas nossas ruas a gritar “do rio até ao mar” também não desejam a solução dos dois Estados, mesmo que às vezes finjam o contrário. Os que não disfarçam, os que querem mesmo o fim de “Israel, o maldito”, esses assumem que só querem um Estado e não dois, fazendo de conta que dele os judeus não seriam atirados ao mar – não estou a inventar, foi isso mesmo que defendeu este fim de semana a proto-candidata à Presidência da República do partido de Rui Tavares, tudo isto e muito mais num texto onde só faltou aplaudir sem disfarces o pogrom do 7 de Outubro, pois até se sugeria que o Hamas não devia aceitar o acordo de paz que está em cima da mesa. “Diz-se que Israel é uma democracia mas isso não é verdade, é um país onde impera o apartheid”. É muito comum ouvir esta frase a comentadores e analistas sem que se lhes peça para, no mínimo, explicarem onde pretendem chegar com ela. Vamos lá ser claros e objectivos: no território que designamos por “Palestina do mandato”, isto é, as terras que estiveram sob mandato britânico entre sensivelmente o fim da I Guerra e 1948, existe um Estado reconhecido internacionalmente e com assento nas Nações Unidas, Israel, e existem territórios que foram ocupados por Israel na guerra dos Seis Dias, em 1967 – os territórios que se assume possam um dia configurar um Estado palestiniano. Esses territórios possuem hoje diferentes estatutos e são administrados por várias entidades, pelo que para perceber se em Israel há ou não apartheid devemos considerar apenas o Estado de Israel, e sobre esse não pode haver muitas dúvidas: 20% dos habitantes são árabes, essa população tem todos os direitos políticos e pratica livremente a sua religião, há partidos árabes no parlamento de Israel, há um juiz árabe no Supremo Tribunal, os árabes israelitas têm acesso ao mesmo sistema de ensino e às mesmas universidades, sendo que há mesmo profissões altamente qualificadas (como as da saúde, médicos, enfermeiros) onde chegam a estar em maioria, incluindo em grandes hospitais. Qual a única diferença substantiva de tratamento? Não são convocados para as Forças Armadas, tal como também não são os judeus ultra-ortodoxos. Mas isso mesmo assim não impede que encontremos árabes no IDF, pois os drusos prestam serviço militar. Para além do mais, quem ande por Israel sabe que há muitas regiões habitadas sobretudo por árabes, algo de que nos apercebemos quando os letreiros deixam de estar escritos em caracteres hebraicos e passam a estar em caracteres árabes. Configura este quadro um regime de apartheid? Só na cabeça de fanáticos ou de quem repete aleivosias sem verificar da sua veracidade. “O que está a acontecer em Gaza é um genocídio, sobre isso não há dúvidas.” Já dediquei todo um texto a este tema, pelo que não vou repetir argumentos, apenas notar que nos dias que correm qualquer guerra que se trave e não agrade aos bem-pensantes passa imediatamente a ser designada como “genocídio”. Já as guerras que criam tragédias humanas bem mais inimagináveis (no Yemen, de onde se continuam a disparar mísseis contra Israel, mais de 350 mil mortos e 21 milhões de pessoas a passar fome; no Sudão onde as Nações Unidas, sem alterarem critérios como fizeram com Gaza, apontam para 24 milhões de pessoas em risco de fome aguda) chocam com um muro de silêncio. Porquê? Porque não encaixam na narrativa maniqueísta que tem sempre de apontar um dedo acusador aos Estados Unidos e aos seus aliados. Mesmo assim, apesar das evidências, antigos responsáveis políticos de topo continuam a alinhar na mesma narrativa (o que talvez ajude a explicar porque tiveram tão pouco sucesso eleitoral). Num país onde a frontalidade não abunda é de facto muito mais confortável alinhar no coro “unânime” em vez de estudar e cuidar de conhecer os factos. “A detenção dos membros da flotilha em alto-mar violou o direito internacional”. Eu sei que Portugal é um país de juristas e que todos pretendem saber de leis, mas a ideia de que Israel só poderia interceptar a flotilha dentro das suas águas territoriais ou mesmo que não a poderia interceptar de todo não tem qualquer fundamento. Primeiro que tudo, há tratados internacionais que regulam este tipo de conflitos, mais concretamente há o Manual de San Remo sobre Conflitos Armados no Mar, assinado em 1994. Nele prevê-se que os Estados podem decretar bloqueios marítimos desde que deles deem nota prévia, que os apliquem a todos os navios sem fazer descriminações e desde que isso não comprometa a situação humanitária. Os dois primeiros pontos não suscitam qualquer dúvida, sobre o terceiro escreverei a seguir, a propósito do carácter “humanitário” da flotilha. Mas se este é o quadro legal, uma vez que não se trata da primeira vez que Israel intercepta barcos que se propõem levar “ajuda humanitária”, será que existe alguma avaliação independente dessa acções? Sim, existe, é o Relatório Palmer de 2011, encomendado pelo então secretário-geral das Nações Unidas precisamente depois de um incidente com um barco turco em 2009, sendo que nele considera-se que o bloqueio naval à Faixa de Gaza respeitava as regras do direito internacional. Ora, se respeitava em 2011, quando não havia uma situação de guerra declarada, mais razões haverá hoje para considerar a acção legal. “A flotilha era uma missão humanitária e ninguém deveria barrar a chegada de ajuda a Gaza”. Creio que depois de tudo o que sabemos hoje é difícil continuar a sustentar que a flotilha pretendia realmente aliviar o sofrimento dos que estão a viver num cenário de guerra, pois se fosse realmente esse o objectivo os organizadores teriam atendido aos apelos do Papa, do governo italiano e por fim do governo israelita para descarregarem essa ajuda ou em Chipre ou, no limite, no porto israelita de Ashdod, o mais próximo de Gaza. Como se sabe recusaram sempre, rumando a um território onde nem sequer existiriam condições para acolher e abrigar aqueles barcos. Mesmo assim, suponhamos que a flotilha transportava entre 30 e 40 toneladas de ajuda humanitária, o que está longe de ser um adquirido (Israel diz que não encontrou praticamente nada dentro dos barcos). Mas se considerarmos essa quantidade de ajuda, então ela daria para encher dois camiões – isto numa altura em que estão a entrar diariamente na Faixa de Gaza perto de 200 camiões. Ou seja, um mês de espectáculo no mar, certamente muitos milhares de selfies e de reels, para levar até Gaza menos de um por cento da ajuda que Israel – sim, Israel – está a entregar diariamente. Temos pois que a missão da flotilha não era humanitária, era de propaganda, mas isso não impediu que durante semanas fosse tratada da forma mais benevolente e amigável possível. Como missão de propaganda – o que é absolutamente legítimo, sublinho – o êxito terá sido total ou perto disso, até porque houve quem preferisse nunca se interrogar sobre o impacto “humanitário” do cortejo naval, antes apresentando-o sempre como uma boa causa, nunca sequer questionando porque não aceitavam os activistas as sugestões de ajuda. Haveria muito mais temas a abordar, mas creio que estes ajudam a perceber como é difícil chegar à verdade dos factos quando a vontade de muitos é criar deliberadamente o mais espesso dos nevoeiros. Só que isso conduz a vários alçapões. O primeiro já o referi de alguma forma ao citar um texto onde dificilmente de disfarça o desejo de que o plano de paz avançado por Trump fracasse, o que é feito mesmo depois de uma mensagem enviada a um “amigo em Gaza” a que este responderia defendendo que sem plano tudo o que possa vir a seguir será ainda pior. Mas será que nos surpreendemos por haver quem defenda o “quanto pior melhor”? O segundo remete-nos para o que aconteceu no Rossio, não muito diferente do que aconteceu em dezenas de locais por todo o mundo onde as manifestações ditas pró-palestinianas acabaram inúmeras vezes em violência. Por coincidência tomei conhecimento dessa notícia quando estava a ler a recensão a um livro recentemente publicado no Reino Unido, The Revolutionists, do jornalista do The Guardian Jason Burke, um livro onde se relata como o terrorismo europeu da década de 1970, o terrorismo de extrema-esquerda de grupos como o alemão Baader-Meinhof, se cruzou e foi influenciado (e financiado) pelo extremismo palestiniano, como os vasos comunicantes entre radicais-chics e islamo-marxistas, tudo bem enquadrado pela Stasi e pelo KGB, redundaram em inúmeras desgraças quer na nossa Europa, quer no Médio Oriente e até no Japão. Dir-se-á: não volta a acontecer. Não estou nada seguro sobretudo ao testemunhar uma escalada de radicalismo que entra pelos olhos dentro e que, ao que parece, só Rui Tavares, sempre muito puro e muito abespinhado, não vê nem quer ver.

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