PENSAMENTOS ABERTOS E LIVRES - 193 (A HIPROCRISIA DA GLRP)
A Grande Loja Regular de Portugal transformou-se, para muitos dos seus próprios membros e observadores atentos, num exemplo acabado de como uma instituição pode trair os princípios que proclama. Sob o verniz de regularidade, ritual e elevação moral, esconde-se uma estrutura pesada, autocentrada e progressivamente irrelevante, mais preocupada com a preservação do poder interno do que com a construção do homem livre e esclarecido que afirma formar.
O secretismo, longe de ser um instrumento simbólico ou iniciático, converteu-se numa cultura de opacidade que protege decisões discutíveis, silencia o contraditório e perpetua práticas que jamais resistiriam a um verdadeiro escrutínio ético. A crítica interna é frequentemente tratada como afronta pessoal, e não como contributo fraterno, criando um ambiente onde a obediência vale mais do que a consciência.
A governação da GLRP evidencia uma concentração de poder quase oligárquica, onde os cargos circulam entre os mesmos nomes, as mesmas lojas e os mesmos círculos de influência. O mérito iniciático, o trabalho efetivo e a dedicação desinteressada são sistematicamente secundarizados face às lógicas de alinhamento, conveniência e fidelidade pessoal. Esta prática corrói a confiança, desmobiliza os obreiros sinceros e alimenta um sentimento generalizado de injustiça.
Mais grave ainda é a hipocrisia institucional entre o discurso e a prática. Fala-se de liberdade, mas pune-se a divergência. Invoca-se a igualdade, mas reproduzem-se hierarquias informais e privilégios tácitos. Apela-se à fraternidade, enquanto se normaliza a exclusão, o isolamento e, em alguns casos, a perseguição silenciosa de quem ousa pensar diferente. O templo, que deveria ser espaço de elevação espiritual, torna-se frequentemente palco de jogos de vaidade e disputas mesquinhas.
A alegada intervenção cívica da GLRP é, na maioria das vezes, decorativa e inconsequente. O seu impacto social é mínimo, a sua voz é praticamente inexistente nos grandes debates do país, e a sua ação concreta resume-se a iniciativas de visibilidade interna, mais orientadas para a autopromoção do que para o serviço à sociedade. Para uma instituição que se reclama herdeira do pensamento iluminista, este vazio de relevância pública é particularmente revelador.
Por fim, a GLRP parece incapaz de se renovar. Afasta os mais críticos, desilude os mais conscientes e retém apenas os conformados. Em vez de ser uma escola de liberdade, transforma-se num espaço de acomodação; em vez de formar homens melhores, forma cúmplices do silêncio.
O pior da Grande Loja Regular de Portugal não é a crítica que lhe é feita, mas o facto de, em muitos casos, essa crítica ser merecida. Enquanto persistir na negação, na autossuficiência e na gestão fechada do poder, continuará a afastar-se daquilo que afirma ser — e a confirmar, tragicamente, aquilo que já se tornou.
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